Tuesday, March 08, 2005

[numa outra história]

"Com a passagem do tempo aprendi a esquecer as suas palavras olhos, a dimensão dos seus adjectivos lábios, a nitidez das suas mãos substantivos. Com a passagem do tempo, passou o tempo sobre os meus passos, e eu fui-me enchendo de esquecimentos que me foram esquecendo. A cidade de que falei já não existe, nem as ruas, nem a loja das mudas, nem as gravatas longas como remos, nem as palmeiras anãs, nem a atmosfera proustiana livre de decadências. Tudo sucumbiu. A música, o salão de bailes, o cão inclinado junto do gramofone. Tudo se perdeu, perdi. Perdeu-se há que tempos o inchaço do meu olho, mas permanece o hematoma da alma e alguma coisa falta... alguma coisa falta, e por isso uma pessoa anda pela vida fora caminhando como um insecto coxo, como uma lagartixa sem rabo, ou coisa assim." Luis Sepúlveda in Encontro de amor num país em guerra

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